O Brasil acordou nesta quarta-feira (18) com uma surpresa: o X (antigo Twitter) voltou ao ar. A rede social, bloqueada no Brasil em meio a uma disputa entre o bilionário Elon Musk e o Supremo Tribunal Federal, estava novamente no ar, apesar de a decisão judicial que determina a suspensão da plataforma permanecer em vigor.
Inicialmente, quando questionada, a Anatel informou que se tratava de uma instabilidade no bloqueio, sem explicar a causa. Com o passar do dia ficou mais claro que se tratava de uma alteração na infraestrutura do X que tende a dificultar, e muito, o bloqueio.
Como explica o gerente de tech da Sage Networks, o X passou por uma mudança nos servidores responsáveis pela distribuição de conteúdo aos usuários. “Antigamente, esses servidores pertenciam ao próprio X, mas agora uma nova empresa, chamada CloudFlare está servindo o conteúdo”, explica ele.
O efeito colateral dessa alteração é que os servidores que foram bloqueados na decisão do STF não são mais utilizados pelo X no Brasil. E isso pode ter um impacto gigantesco na internet brasileira.
Isso porque a CloudFlare é uma gigante da infraestrutura, cujos serviços são utilizados por incontáveis sites ao redor do mundo, o que, obviamente, inclui o Brasil. Segundo dados da W3Techs, quase 20% de todos os sites da web utilizam o proxy reverso da companhia.
“A ordem do Supremo Tribunal Federal determina que usemos todos os meios técnicos necessários para inviabilizar o acesso ao X. Se esse acesso foi viabilizado por uma nova frota de servidores de um novo fornecedor, as operadoras precisam reagir e bloquear os servidores da CloudFlare. O porém é que ele é usado por vários sites brasileiros, então o cumprimento causaria um apagão da internet brasileira, afetando sites lícitos, sem nenhum atrito judiciário”, explica Ayub, que é gerente de uma das empresas que precisa cumprir ordem de bloqueio do X.
Ou seja, não há como bloquear o IP da CloudFlare no Brasil sem afetar inúmeros outros sites legítimos.
Uma nova provocação de Elon Musk?
Diante do histórico de atritos entre Elon Musk e o STF, é impossível não cogitar a hipótese de que essa mudança nos servidores tenha sido proposital, como uma forma de provocação ao Supremo e ao ministro Alexandre de Moraes. No entanto, também não é possível confirmar a teoria.
“Empresas legítimas sem nenhum tipo de atrito judicial utilizam o serviço da CloudFlare. Ele é um serviço para garantir que sites e serviços carreguem mais rapidamente ao distribuir a carga de acessos por vários servidores”, conta Ayub.
Então, ainda que essa alteração não tenho sido feita pensando em burlar o bloqueio, esse é o seu efeito prático no Brasil.
E agora?
Diante de um dilema sobre seguir a decisão à risca e causar um apagão na internet, as operadoras devem estar discutindo internamente com seus departamentos jurídicos sobre o que fazer em uma situação do tipo. “Carece um esclarecimento do Supremo”, reforça Ayub.
Por este motivo, o ex-Twitter tem se mantido no ar, mas não há como prever por quanto tempo. Se mais sites brasileiros começarem a enfrentar instabilidades, pode ser um sinal de que as operadoras optaram por seguir a decisão do STF de maneira literal, sem levar em conta as consequências.
Ayub também cita que a própria CloudFlare pode ser intimada sobre o tema, o que faria com que ela tenha que bloquear diretamente o acesso ao X. O porém, neste caso, é que a companhia não tem representação no Brasil, então precisaria contratar algum escritório de advocacia para lidar com a questão. Resta saber qual seria a postura da empresa ao entrar na mira do Supremo, e se ela acataria a decisão de bloqueio da rede social ou ignoraria as ordens, como decidiu fazer Elon Musk.
Vale notar que há precedentes internacionais para casos similares. Na Itália, a CloudFlare se envolveu em um problema parecido quando endereços de IP ligados a sites de pirataria foram bloqueados. Isso fez com que seus serviços ficassem indisponíveis, derrubando vários sites legítimos.